6 de dezembro de 2008

Psicopedagogia



O DESENHO E A APRENDIZAGEM

Terezinha Véspoli de Carvalho
Garatujas, girinos, sóis, desenhos transparentes, e cada vez mais próximos da forma que podemos chamar de real, são as representações de como a criança lê o mundo, enxerga a vida, expressa o que sente.


Desenho, primeira manifestação da escrita humana. Continua sendo a primeira forma de expressão usada pala criança.
"Garatujas", "girinos", "sóis", desenhos "transparentes", e cada vez mais próximos da forma que podemos chamar de "real", são as representações de como a criança lê o mundo, enxerga a vida, expressa o que sente.
À medida que vai sendo alfabetizada, a escola se encarrega de afastar a criança desta forma de expressão e ela, como muitos de nós, vai dizendo que "não sabe desenhar".
Trabalho há mais de quinze anos com crianças de quatro a sete anos, como professora e, mais recentemente como psicopedagoga e, muitas vezes, senti grande tristeza em ouvir professoras de crianças em idade pré - escolar dizerem: "vou dar desenho mimeografado para meus alunos porque eles não sabem desenhar".
E eu pergunto: o que é este saber?
Por que proibir a criança de se expressar graficamente da forma como ela consegue?
Como querer que a criança use símbolos gráficos estipulados pelo adulto, que são as letras, se ela não elaborar sua idéia usando símbolos que ela conhece?
Expressar - se através do desenho é colocar sua vida no papel, com toda a emoção.
Através do desenho livre, a criança desenvolve noções de espaço, tempo quantidade, seqüência, apropriando-se do próprio conhecimento, que é construído respeitando seu ritmo.
Aprende também a função social da escrita pois sua comunicação, feita através do desenho ,pode ser compreendida por outras pessoas antes que ela aprenda a usar a escrita convencional para se comunicar.
Quando a criança se sentir madura, usará com mais facilidade os símbolos gráficos com os quais já vem tendo contato nas ruas, nos ônibus, nas propagandas que ela vê todos os dias e também na escola onde os usa formalmente.
Segundo Emília Ferrero, "aprendemos a ler lendo, a escrever escrevendo", e, como afirma Jean Piaget , quando aprendemos algo novo, temos que recorrer ao que já sabemos e nós nos apropriamos do desenho como forma de representação gráfica desde a primeira vez que temos contato com lápis e papel e conseguimos coordenar os movimentos do braço e da mão segurando o lápis e riscando o papel (o que pode acontecer por volta dos 2(dois) anos ou às vezes até antes desta idade) .
Mesmo que estes desenhos não possam ser interpretados com significado pelo adulto. Mesmo que a criança mude de idéia cada vez que perguntarmos o que ela desenhou.
Gostaria de ressaltar que é por isso que não devemos escrever no desenho da criança. Além da "obra" ser dela, ela muda de idéia a cada instante, principalmente antes dos 5 ( cinco) anos de idade .Portanto, a escrita do adulto é uma "invasão" sem proveito pois quando outra pessoa for olhar o mesmo desenho ele poderá ter outro significado.
O desenho precisa e deve ser sempre valorizado pelos educadores e a importância desta valorização deve ser compreendida e compartilhada pelos pais , uma vez que toda aprendizagem tem seu valor e o desenho é uma forma de aprendizagem.
Quando a criança é valorizada naquilo que sabe, sente prazer em aprender.
As letras demoram a ter significado para ela e nós teimamos em atropelá-la.
Se ela não consegue simbolizar da forma como sabe, como conseguirá se apropriar de algo que, algumas vezes , ainda não lhe atingiu ?
É claro que a criança deve ler e escrever muito, desde quando comece a demonstrar interesse. Aliás, esse interesse pode se manifestar antes do que se espera.
Já nos primeiros estágios, na escola de educação infantil, ela começa a identificar o próprio nome e o dos colegas, e deve ter a oportunidade de escrever palavras da forma como ela acha que devem ser escritas, testando, assim, suas hipóteses, como nos mostra Emília Ferrero, através de seus estudos amplamente divulgados.
Mas, a criança requer um tempo para diferenciar o desenho da escrita, e elaborar suas hipóteses e esse tempo deve ser respeitado.
É necessário, porém, que seu "saber" seja legitimado pelo adulto, isto é, é preciso que o adulto valorize as produções da criança como um "saber" legítimo, real e, para isso, a escola deve estar integrada com os pais e a comunidade.
As pessoas que fazem parte do universo da criança e de quem ela busca respeito e aprovação devem compreender o processo pelo qual ela passa e o que os professores estão fazendo nesse sentido valorizando, também, seus progressos na forma de expressão.
Se esse progresso não for valorizado, a criança pode se retrair sentindo - se inferiorizada e incapaz.
E ninguém é incapaz, todos temos capacidades e , quando somos valorizados naquilo que sabemos, desenvolvemos cada vez mais capacidades pois nos sentimos autorizados a alçar vôos cada vez mais altos.
Mas, se formos sempre julgados pelo que não sabemos, nos sentiremos cada vez mais fracos e incompetentes, permanecendo presos ao ninho, sem ousar alçar vôo para lugar algum.




REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
Bossa, Nadia A e Vera Barros de Oliveira( orgs.) Avaliação psicopedagógica da criança de sete a onze anos 3a edição 1997 Ed. Vozes Petrópolis
Fernandez, Alicia A inteligência aprisionada abordagem psicopedagógica clínica da criança e sua família 2a reedição 1991 Artes Médicas Porto Alegre
Ferrero, Emilia & Teberosky, Ana psicogênese da língua escrita Trad Diana Myriam Lichtenstein, Liana Di Marco e Mário Corso Supervisão da tradução: Alfredo Néstor Jerusalinsky- psicanalista 3a edição 1990 Ed. Artes Médicas, Porto Alegre.
Moreira, Ana Angélica Albano o espaço do desenho coleção espaço ed. Loyola São Paulo
Furt, Hans G. Piaget e o Conhecimento: fundamentos teóricos; trad: Valerie Runjanek, 1974 ,ed. Forense Universitária, Rio de janeiro

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